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terça-feira, 31 de agosto de 2010

III DIÁRIO



11.08.2010 – Madrugada e manhã de tempestade tropical. Muita chuva, trovoada e vento. Temperatura sempre boa. No “Auberge” de Segou o triplo a.p.a são CFA 39.000. Ao de leve Segou recomenda-se. Apelidava-a de uma cidade rústica e cosmopolita. O Rio Níger é enorme em frente às margens da cidade. Transborda também. O nosso destino de hoje é Djenné, famosa pela sua grande mesquita de barro. Depois de 30kms em asfalto entramos em pista de barro. Serão 230kms de magnífica pista de barro com passagem por vários povoados.





Paisagem bucólica e chuva só um pouco. A terra quente e a vegetação transpiram e o seu suor é de um odor forte, que oprime os brônquios não deixando contudo de ser agradável, relaxante. Próximo de Djenné chama-nos a atenção um povoado distante pela sua enorme e imponente mesquita que se destaca no meio do casario barrento e rasteiro. Pelos binóculos vimo-la melhor. É imperdível. Vamos visita-la.



O ritual introdutório é cumprimentar e conversar um pouco com os anciãos da aldeia que desta descansam e cavaqueiam numa plataforma de madeira à entrada do povoado. Depois, com o seu consentimento ajudado por uns CFA para cola lá entramos no povoado. Ruelas muito estreitas em terra batida, lama e água mas, em tudo o mais, limpa. Brincamos e fotografamos a criançada que estava eufórica.



Chegamos à mesquita no ponto mais elevado. É magnífica mas está “asfixiada” pelo casario pelo que não pode ser devidamente apreciada e fotografada.



Os insectos não nos largam. Voltamos a descer e retomamos a pista para o nosso destino. À entrada da aldeia há um lago onde tudo o que é mulher lava a roupa e a louça e a criançada brinca e chafurda.
Djenné é uma desilusão como urbe. O seu pessoal não fica atrás. Alojamo-nos no “Campement Hotel Hauber” – quarto triplo CFA 25.000 e duplo 20.000; pequeno-almoço CFA 2.000 e jantar CFA 5000. De “campement” tem os telhados dos bungalows que nesta época são inutilizáveis. Pessoal do hotel nada simpático e prestável. Sem net, chovia pelo telhado de palha da recepção, os bungalows tinham AC mas eram paupérrimos. A “foto” estava feia. Não merecia a impressão quanto mais a moldura. Se fosse possível carregava no “delete” - tudo muito fraco. Demos uma volta à vila. Na praça a seguir ao hotel decorria um jogo de futebol entre djennenses com uma bola muito leve e fugidia. Seguimos para a mesquita sempre acompanhados pelos insectos voadores e os pedantes também. Não há forma de nos livrarmos deles. A mesquita está em obras e custa uma fortuna visitar o seu interior que nada tem de interesse. É apenas para franquear.



Queríamos comprar uns chapéus Dogon e o Antonio disse-nos que o melhor local era o mercado que transbordava para a praça da mesquita. A mesquita fica melhor na fotografia. Vá lá – é fotogénica. Lá entramos no recinto do mercado. A enxovia e colorido do costume, em sujo e fedorento. Sempre que podemos “roubamos” umas fotos. As vendedeiras não curtem principalmente porque não compramos nem confraternizamos. É “roubar” mesmo. Conscientes, mas não conformados, sempre vamos fazendo uns click.



O “man” dos chapéus não veio mas o nosso guia involuntário diz que logo ali e coisa e tal não faltam chapéus bons e baratos, claro. Não fizemos negócio para seu descontentamento. Como não fiz grande negócio com o tuareg de Segou decidi que os próximos remediariam o deficit. Aceitaria ser benevolente se houvesse troca por roupa que levava para o efeito. Caso contrário só pechinchas. Mas o que regala as vistas deste pessoal é o material electrónico. Não voltamos para o hotel sem que o nosso guia nos levasse pelas congostas do vilarejo e nos fizesse entrar numa casa e subir até ao telhado onde dizia haver chapéus Dogon para venda. Por um momento pensamos que nos estava a por a jeito mas não. Esta gente é ardilosa, teimosa, melguenta, mas não é delinquente nem violenta. Os magníficos telhados de Djenné...



Depois de muito "bargain" comprei três colares numa banca perto do hotel. Já no recinto do hotel, logo à entrada, existiam umas barracas de artesanato. Tinham peças interessantes inclusive os chapéus. Antes e depois de jantar foi uma azáfama negocial. Ao jantar não tinham bebidas alcoólicas nem permitiam que trouxéssemos as nossas. Ficamos furiosos. Perguntamos se era pelo facto de estarmos no período do Ramadão que começava no dia seguinte – o que até compreenderíamos – dizem que não. A proibição é para sempre. São motivos religiosos. Grandes talibãs. Tirem-me daqui. Ficou famosa a frase – Djenné jamais. Quanto às negociatas fui mais uma vez bastante benevolente nas trocas. Resumindo: permutei com um dos comerciantes do hotel, uma máscara, uma estátua Bambara (a Tyi Wara que é o troféu atribuído ao melhor agricultor do ano) e um chapéu Dogon por € 40 e 4 pólos. Por ele ficávamos a negociar mais material mas eu logo disse que a partir de agora seria só troca directa.



Apareceu o Roman que tinha ficado em Bamako a tratar do visto para a Mauritânia. Claro que na embaixada ficaram curiosos como é que ali estava sem visto. Clandestino pois claro. Grande maluco. Anda por aí sozinho por estradas e pistas. Desta, quando se dirigia a Djenné, para cortar caminho, meteu-se já de noite numa pista. Acontece que, logo à frente a pista estava alagada. Parou no último momento. Mais um pouco passaria a noite atascado no meio do nada e com os pés molhados. Borrou-se todo. Isto é sorte pura e um acto destes é manifestamente reprovável. A aventura pode terminar com um acto irreflectido destes. Para si e para os companheiros de viagem. Como anda num carro a gasolina, produto dificil de encontrar por aqui, desespera para arranjar combustível e fica para trás á procura do dito (anda carregado com bidões de plástico cheios na mala...). Uma bomba relógio este Glacius. O seu móvel não funciona. Uma figura desafogada à solta em solo que pede alguns cuidados.
Depois do jantar voltei aos negócios por insistência de um dos comerciantes. Logo lhe disse que não tinha mais dinheiro. Só troca por roupa. De volta negociei duas estátuas de um casal Soré (do povo Amoré, rima não é?) em bronze e nas quais se encontra a serpente símbolo da abundância e da sorte (a serpente de um modo geral vive onde há abundância de água, vegetação e outros animais que lhe servem de petisco). Acabo de atender este e logo sou chamado pelo primeiro. Desta foi ao baú buscar as preciosidades. Pronto mais umas roupitas e lá trouxe uma máscara Bozo em terracota e duas em ébano para equilibrar o negócio. Bom, se não foi assim foi parecido. Só vou confirmar quando “desmontar” os embrulhos e as malas. Estes comerciantes ganham a vida com o artesanato mas fazem questão que se negoceie o preço, exigem explicar a origem e o significado de cada peça, especialmente as máscaras e as estátuas. Nós é que entramos e saímos a todo o gás pois o raid não permite muito relax. É com pena que não falamos mais um pouco com os locais e aprofundamos as suas lendas, a sua cultura, a sua religião...



12.08.2010 -Madrugada de chuva forte. Manhã encoberta mas sem chuva. Entrar e sair de Djenné pelo lado sul obriga a usar o ferry para uma pequena travessia do Bani, afluente do Níger. Como sempre os vendedores aguardam os viajantes. Lá fiz mais um negociozito – uma estátua esguia em bronze de uma agricultora. As estátuas esguias africanas de madeira ou bronze são magníficas. Hoje terminamos a nossa etapa em Sangha, um dos muitos povoados do Reino Dogon. Estes povoados situam-se por toda a Falésia, Planalto e Planície de Bandiagara. Pelo caminho temos um P.E. nas Ruínas de Hamdalalle a norte de Somadougou (e não a sul como o António colocou no programa para o pessoal se perder e falhar o ponto) e outro, no porto fluvial de Mopti onde almoçaremos. A paisagem é sempre verde, viçosa e está tudo enlameado. Após a época das chuvas as construções e casas, todas feitas de barro, têm que ser restauradas e conservadas. Por isso, a maioria das paredes das construções, edificadas em estilo sudanês, são atravessadas por vigas de madeira que servem não só para segurar o barro como de andaimes para os trabalhos de conservação. As suas paredes vão sendo corroídas pela chuva forte transformando-se num aguado lamacento que corre pelas ruelas e regos a céu aberto. Após as ruínas, percorremos 30 kms de pista até Mopti. Bela pista.
Em Mopti o PE é no grande porto fluvial. Daqui afluem e zarpam todos os barcos que transportam pessoas e mercadorias pelo Rio Níger até Tombouctou com vários apeadeiros, claro. 



O Restaurante Bozo onde planeamos almoçar ficava no lado contrário ao que estacionamos. Para não contornarmos o perímetro do porto, obra deveras difícil, apanhamos uma “pinaza”, uma piroga local, feita em tronco de árvore escavado que, habitualmente com muita gente a bordo, assusta um pouco pois a água quase entra a bordo. A ideia de cair naquela água suja e barrenta não é nada agradável.
O prato não podia deixar de ser peixe (capitão) que parece que tiveram que ir pescar após a encomenda. Por defeito, demoraram duas horas para nos servir. Ressalve-se a cervejinha que nunca faltou. A quantidade de comida servida foi muito pequena para o pessoal que depois de tão longa espera, estava esfomeado. Estava bom? Isso sem dúvida. Nem parecia peixe de rio, muito menos de água quente. Magnífico pitéu. Quando nos levantamos, como sempre, tudo o que é vendedores nos aguarda. Passamos pelos estaleiros onde, com muita mestria, são escavados os "veículos" que circulam no rio. Voltamos de piroga desta só eu, o António e outro passageiro que fomos deixar a um barco bastante maior. Ao que presumi seguiria nele para uma jornada mais longa. Isto fez com déssemos um passeio por toda a baia do porto que tem um transito fenomenal de embarcações de grande colorido e tamanho variado, algumas preparadas para fazer o “cruzeiro” de vários dias até à capital sagrada do deserto.



Abriu o sol e sentimos logo o rigor tropical mesmo no meio da água. Chegados ao “parking” grande confusão: tudo e todos queriam receber o parqueamento das viaturas. Como os empurramos todos para o António, “no veas”. Ele já está perfeitamente habituado.
Continuamos para Sangha, via Bandiagara, onde vamos ficar hoje e amanhã para visitarmos alguns povoados. São 50kms de asfalto e 30kms de pista de barro e rocha, sem pedra solta e algumas passagens a váu.



Ficamos no Campement/ Hotel La Guina – triplo CFA 30.000 e duplo CFA 25.000; p.almoço CFA 2.000 e refeição CFA 4.000. Ao jantar conhecemos um casal holandês que viajava com as três filhas. Viajaram desde Roterdão em dois 4x4. Na Mauritânia vaguearam pela Pista do Comboio, Atar, Chinguetti, Tidjika e finalmente Tombouctou onde venderam um dos carros. Daí vieram para Sangha. Depois de um serão de troca de vivências, experiências e duas de branco fresco tudo a dormir.

13.08.2010 - Hoje não levantamos arraial. Vamos visitar os povoados circundantes e voltamos à base - Sangha. As paisagens, rios e albufeiras circundantes são de uma coloração magnífica.



Um local veio perguntar ao Vicente se queria que lhe lavasse a roupa ao que este respondeu que sim, dependendo do preço. Achou o valor tão exorbitante que lhe disse para ir buscar a roupa dele que, por esse preço também lhe lavava a dele.
Confirma-se que a África é pobre mas não é barata.
Lá fomos dar o nosso passeio pela falésia que é magnífica com a sua imponente queda de água e as construções Telem e Dogon nas rochas até alturas impensáveis.





Descemos a falésia e já no planalto, a 350m de altura, torneamo-la admirando as construções edificadas na base e arribas.



Paramos numa plateia natural virada para a falésia, entre três árvores, para preparar o almoço. A temperatura está fabulosa, o céu nublado com abertas. Um lugar a fixar (N14°26.580’/W03°17.786’). Está a sair uma tortilha com cogumelos feita pelo Tomás e esposa que está com um óptimo aspecto. Não era só aspecto, estava deliciosa.
Quando não eis que aperece um Toyota de aluguer com condutor com o pessoal do Peugeot 405 que tinham ficado em Sandaré – o Joan, o David, o Ivan e a Mónica.
Não tínhamos notícias deles há três dias e aparecem – nos neste lugar remoto. Por estas bandas, vá lá saber-se porquê estamos sempre a ser surpreendidos. Repararam-lhe o cárter, deram um “jeito” na frente e já está apto para rolar. Por precaução deixaram-no em Bandiagara e vieram para os povoados de 4x4 alugado. Foi uma surpresa magnífica. Nada sabíamos da sua sorte e, afinal, conseguiram avançar “alive and kicking”. Almoçamos juntos enquanto nos contaram os pormenores da sua aventura. Não podiam faltar os habituais locais que aparecem do nada e nos “envolveram”.



Um deles montou banca de artesanato e, diferentemente de todos os restantes que nos melgam, não disse uma palavra. Fomos nós que nos abeiramos e lá fiz mais uma comprita: duas pequenas estátuas dogon em ébano que apelam à boa sorte.
Passamos pelos povoados e admiramos as esculturas em madeira.



Voltamos para o hotel. O Suliman vai connosco visitar o interior de Sangha. A aldeia é comunitária, com ruelas muito estreitas e as construções variam entre o xisto e o barro sendo este bastante mais preponderante.



O povo Dogon é agricultor. Os seus vizinhos Peul são pastores. A casa grande da família é um elo muito importante. Quando casam os dogon “montam” casa mas a casa dos pais continua a ser a casa da família que fica em herança para o filho mais velho. A família do Suliman é a “Tartaruga”. Então, no curral, que fica no perímetro exterior da casa, têm uma tartaruga convivente com as cabras e as galinhas. Algumas casas têm cozinhas típicas dogon – a parede frontal é decorada em favo e têm pendurados vários objectos de culto e do quotidiano e caveiras de animais. A porta principal e o postigo são esculpidos. No beiral superior estão cheias de ninhos de andorinha. É também vulgar o silo para guardar os cereais. O chão é em terra batida e nesta aldeia encontra-se bem limpo.
Fomos visitar a casa do ferreiro e sua forja. É uma actividade importante na aldeia. Conhecemos também a viúva do anterior Hogon – o ancião chefe da aldeia. Muito de fugida apontou-nos o actual que aparentava pressa. A praça dos povoados Dogon têm uma espécie de telheiro - com pilares e estrutura em troncos de madeira esculpidos e telhado com várias camadas de colmo - onde os mais velhos passam parte do dia a descansar e conversar em compridos bancos de madeira que, com o uso até estão brilhantes, de polidos. Estes telheiros são a "A Casa da Palavra” da aldeia. Quem tiver algo para dizer ou alguma queixa a fazer à comunidade é nesse local que deverá manifestar-se nas reuniões que aí acontecem frequentemente. E por esse motivo é que são edificadas com o tecto tão baixo. Se o orador se exaltar e tentar se levantar para falar mais alto, logo bate com a cabeça nas traves e amansa. Cool.



Existe também na aldeia as “Maisons des Régle” que são umas cubatas no limite do perimetro da aldeia para onde vão as mulheres quando estão no período menstrual. Deixam a casa da família e vão para essas cubatas. Passado o período regressam à família. Prontos pá.
Visitamos também o túmulo do primeiro francês que visitou o reino dogon e cuja ossada ficou em Sangha. O moinho comunitário também foi visita obrigatória. Perdeu um pouco o seu encanto original já que agora é movido por um motor a gasóleo. É o andar dos tempos numa das aldeias conservadas e vivas mais antigas que existem.
Assim terminou a nossa visita e voltamos ao hotel com o nosso guia e outro que se colou. Oferecemos-lhe uma cerveja e estivemos a beber e a conversar um pouco com eles. Acho que não estão habituados a beber e logo perderam o “fio do jogo”.
Após o jantar ouvia-se sons de festa vindos da aldeia. O Miguel e o Tomás, curiosos, decidiram ir ver. Chegados encontraram um grupo de jovens raparigas a cantar e a dançar enquanto os rapazes assistiam. Terminada a performance elas dirigiram-se aos intrusos espectadores a solicitar “cadeaux”, o costume. O Miguel que andava sempre com os seus balões para oferecer à criançada encheu alguns e deu-lhes.
Bom, a coisa não caiu nada bem. As raparigas acharam o “cadeaux” desajustado e começaram a barafustar contra eles. A coisa começou subir de tom.
Os rapazes tentavam acalmar as moçoilas mas não deram conta do recado.
O Miguel e o Tomás começaram a ficar amedrontados e a recuar sem tirar os olhos de cima delas já que, quando voltaram costas, começaram a “voar” alguns objectos que estas arremessavam. Imaginem isto a uns quinhentos metros do Albergue, sós, à noite, num povoado de barro, com ruelas muito estreitas e labirinticas, sem qualquer luz a não ser a lanterna de cabeça do Miguel que era um dos objectos cobiçados pelas agressoras.
Quando conseguiram algum espaço deram a correr para fora da aldeia em direcção ao albergue.. Não ganharam para o susto e valeu-lhes que os moçoilos em vez de se empertigarem procuraram acalmar a ira das fêmeas. Esterismos colectivos nestes cenários são complicados.
Era Sexta feira, dia 13. A coisa correu-lhes bem.



14.08.2010 - Temos hoje pela frente uma longa jornada. Vamos atravessar o Reino Dogon e visitar alguns dos seus povoados percorrendo 80kms de pista que, com as recentes chuvadas, estão inundadas e enlameadas com alguma zona de rocha também. Como bem agrada aos offroaders.



Já na EN, parcialmente em pista de barro, atravessaremos a fronteira do Mali entrando no Burkina Faso. O estradão em pista de barro que se segue levar-nos-à a Ouahigouya.
Desciamos a falésia quando vemos à esquerda, entre o arvoredo, um Patrol com matricula portuguesa. Paramos e dirigimo-nos ao jipe logo aparecendo um nosso patrício com quem trocamos algumas vivencias de viagem. Andavam a “circular” por África à três meses e vinham da Guiné Bissau. Continuação de "bonne route" amigos.
Passamos várias aldeias e paramos em duas – Domblossougou e Barapireli - para visitar e tirar umas fotos.





O ritual já foi descrito - chegar aos povoados e dirigir-se aos anciãos que normalmente estão a dormitar na “Casa da Palavra”. Cumprimenta-los e dar-lhes alguns CFA. Só depois é que se pode visitar o povoado e tirar umas fotos. Sucede que, num dos povoados, um dos velhotes não ficou lá muito contente com o donativo e manifestou-o provocando algum burburinho. Ainda tirei uma foto a um deles e ao telheiro mas quando ia para fotografar outro, já tal não permitiu.





Foram conversando com o António a pedir mais alguns CFA enquanto nós íamos “roubando” mais algumas fotos. A 15 kms da fronteira atasquei o Toyota que teve que ser rebocado de traseira pelo Patrol do Miguel.







O António começou a gozar... Não tardou a vez dele...





A pista termina num pântano bem difícil de ultrapassar e depois surge a povoação de Koro, povoado fronteiriço onde está a alfandega se entrega o passavant. Para encontrar o posto deciframos um autentico labirinto. Uns 10kms à frente a policia de fronteira. As instalações uns barracos; as linhas de fronteira umas pedras e uns bidões. Segue-se a fronteira do Burkina Faso. Toda esta ligação é feita num estradão largo de terra vermelha que dá para rolar bem. As instalações burkinabes têm melhor aspecto e só pagamos CFA 500 na policia e depois, em Thiou, mais CFA 5000 para a alfandega.
As demarches de entrada no Burkina são muito mais simplificadas. Alás é um pais mais limpo e organizado que os anteriores que visitamos. A Luso Team (o HDJ 80 e o Patrol) tinha decidido levar o Diego a Ouagadougou para apanhar o avião no dia 16, logo não ficaríamos em Ouahigoya. Comentamos com o pessoal a nossa intenção. Todos decidiram seguir para a capital, principalmente quando o António disse que o hotel tinha piscina e pizzas.
A pista de barro mais à frente fica demolidora com tantos buracos e regos.
Tremenda mestria a das cabras a comer em duas patas as folhas das acácias carregadas de picos enormes.
Está tempestade para os lados da capital. Esperamos que seja passageira.
Não é e está a agravar-se. Já não se vê a 30 mts. Depois abrandou mas não parou.
Ouagadougou recebe-nos molhada. É a cidade das bicicletas. São aos milhares. Tínhamos planos para um passeio depois do jantar mas a chuva e o vento não pararam e desanimamos. Apenas o Diego, em final de raid (partia de avião para Londres no dia seguinte) e  que não tinha jantado, decidiu ir ao centro. Lá convenceu um dos funcionários do hotel e foram na mota deste.
Estava focado em jantar no “De Niro” dada a indicação do Lonely Planet. Nada feito. O restaurante aparentava estar fechado havia tempo. Terminou num restaurante chinês e depois deu uma volta pelo centro onde descobriu um bar, o “Loft”, onde foi beber um copo com o seu "motorista". O Diego convidou-o a beber um cocktail como o dele mas este recusou o convite dado o custo da bebida, € 8,00. Tomara,  o seu salário mensal eram € 50.
Quem estava também no hotel era o Pepicant de quem nos tínhamos despedido em Sangha. Foi para a capital pois regressava a Espanha de avião na madrugada seguinte mas antes pretendia vender o seu Mitsubishi Pajero. Teve sorte. Naquela tarde conseguiu negócio por um preço bem razoável. Despedimo-nos mais uma vez dele e do filho desejando-lhes boa viagem. A nós desejaram-nos o mesmo.



15.08.2010 - A manhã foi também de despedidas. Do Diego, companheiro de viagem da Luso Team e que parte amanhã de avião para Inglaterra. Fizemos grande amizade e prometemos reencontrarmo-nos o mais rapidamente possível. Despedida também da famigerada Team Peugeot 405 que já não seguia para Bobo Dioulasso. O seu destino sempre foi Cotonou, capital do Benim. Com o azar do cárter já não quiseram desviar-se de rota e estavam indecisos se vendiam o Peugeot em Ouaga ou se seguiam nele até ao seu destino e o vendiam lá.
Despedidas feitas fomos dar um passeio pelo centro da cidade que embora limpa e arrumada não mostrou nada de atractivo. É uma capital pobre de um pobre pais africano. Mas é uma cidade briosa. O calor e a humidade que se faz sentir logo nos empapa. Vamo-nos habituando mas não somos destas bandas.
Hoje, ao final do dia, em Bobo Dioulasso, termina o Raid Burkina 2010 e é para lá que nos dirigimos. Pelo caminho desviamos com o Miguel para apanhar um geo – tesourinho. Passamos por uma coluna militar apeada chefiada á frente e atrás por duas mulheres. Burkina no seu melhor.
Procurar tesourinhos em geocaching é sempre obra. Fuça aqui, fuça ali. O tesourinho, ao que parece, foi colocado no terreno que pertencia a uma missão e o local evidenciava obras recentes. Lá foi o dito. No problem. Procura-se outro.
À saída da cidade vários troncos de árvore esculpidos. Uma boa ideia. Em vez de arrancar as arvores, que tal esculpi-las?
Saímos de rota para mais um tesourinho falhado mas desta subiram em vão um elevado promontório bem íngreme e distante de onde aparcamos os carros.
Em África não há reboques ou são raríssimos. Se tens uma avaria na estrada que não possas deslocar-te por meios próprios a solução é fazer o conserto na estrada. Se for necessário substituir peças à que tira-la no local e ir buscar outra para repor. Se for para consertar peças o processo é o mesmo. Desmontar, ir conserta-la e voltar para a repor. Para sinalizar as avarias em estrada usam arbustos. Cortam uns quantos e colocam-nos à frente e atrás do veiculo a uma distancia razoável.
Chegamos a Bobo Dioulasso.



O Toyota saiu de Ourém com 285.848kms e está com 292.770. Rolamos 6.922kms. Alojamo-nos no Hotel Auberge (CFA 36.000 a.p.a.), banho de piscina, de banheira e vamos jantar para festejar o final do Raid Burkina 2010. A mesa está posta na borda da piscina.
Dos participantes faltam, por ordem de despedida: o Pablo da BMW que teve um acidente antes de Bojador e foi repatriado para Espanha; Pepicant e filho que se despediu de nós em Sangha e voltamos a encontrar em Ouaga; os quatro magníficos do Peugeot 405 que ficaram em Ouga para seguir para Cotonou, capital do Benim e daí de avião para Espanha; o Diego que também ficou em Ouga para voltar para Inglaterra de avião. Convidados a filha de António e uma amiga que apareceu e se juntou ao grupo que passo a nomear: o António; o Roman “Glacius”; o Vicente e seus dois filhos; Tomás e a esposa e a Luso Team composta por mim, o Frederico, o Diogo e o Miguel. O António, desorganizador máximo propôs que todos fossem considerados vencedores do Raid. A “porra” seria para pagar o jantar e o que restasse seria dividida por carro. Toda a gente aceitou e coma-se muito e beba-se melhor.
Com alguns contratempos terminou bem o Raid Burkina 2010.
Para o ano “A Tribo” (La Tribu) vai até à Costa do Marfim.
Depois do jantar ainda fomos ver um show de precursão num clube perto hotel. Aliás, Bobo, é uma cidade de música que atuam por tudo quanto é lado ou bar.
Durante toda a noite ouvimos música proveniente de todas as coordenadas.



Amanhã começa o nosso regresso. O resto do grupo, que vai seguir directo, fica mais um dia em Bobo.
Nós partimos amanhã e não podemos deixar de ir por Dakar...

domingo, 29 de agosto de 2010

II DIÁRIO




06.08.2010 – Despertar às 7h. É sempre bom chegar cedo a uma fronteira africana porque a coisa sempre se complica. Correu bem? Foi rápido de ambos os lados? Acorda, estás a sonhar ...
Chegamos a Guergarat ainda a fronteira estava fechada. Supostamente deveria abrir às 9h mas não há jeito. Uma meia hora depois lá a coisa começou a mexer. Docement...
O ritual é o seguinte: carros em fila aguardam a vez de serem chamados para entrar no “parque” da fronteira. Se não querem levar uma daquelas descomposturas jamais ultrapassem o sinal de “Haute de Police” sem a instrução do “fardas”.
Enquanto se aguarda, para adiantar serviço, pode levantar-se o formulário fronteiriço e preenche-lo. Entrados, o passo seguinte, é o guichet da polícia. Há que colocar o passaporte e o formulário no canto direito do guichet. Se já lá houver outros é coloca-lo por baixo. Nada de malandragem. Está tudo atento...
Chegando a vez o "secretário" chama pelo que é melhor aguardar por perto ou ter alguém a controlar. Para tratar dos trâmites de saída do veículo o responsável pela viatura quando liberado da policia deve dirigir-se à aduana com o passaporte, o documento único e o documento de entrada do veículo em Marrocos. Só fica a faltar a Gendarmerie que também têm que "anotar". Para evitar atrasos e perdas de vez o melhor é levar sempre todos os documentos. Assim, não falta nenhum.
Liberados dos tramites fronteiriços estamos prontos para atravessar a franja de terra com cerca de 3 kms que separa a fronteira marroquina da fronteira mauritana - a terra de ninguém
Na fronteira mauritana os procedimentos são mais ao menos os mesmos acrescendo que têm que se estar munido de visto e fazer o seguro do automóvel que pode cobre diversos países (escolher o que mais interessa conforme o trajecto visado).



Apareceu o Arturo, um guia mauritano bem conhecido de muitos portugueses destas andanças e um cromo que tinha trabalhado na pesca com portugueses que não se cansava de dizer alto e em bom som: “Então português, estás bem ou estás fodido, pá? És de Peniche, português?” Claro que fica a faltar aqui o sotaque e o “look” do cromo.Todos andam a ver se ganham algum no que quer que seja que o transfronteiriço precise. Até o Arturo anda a fazer trabalho de fronteira. Não há expedicionários para acompanhar na pista do comboio, Atar, Chinguetti “and so on”. A insegurança reduziu quase a zero o turismo no Atar mauritano.
Depois da frescura da manhã vêm o calor do meio-dia que aperta um pouco. A expectativa aperta ainda mais pois um dos viajantes não têm visto. Há um espirito "apostador" no ar. Vai passar, não vai passar? É que não estão a emitir vistos na fronteira. Uma rapariga informa-nos que os "fardas" marroquinos estavam a zoar o facto de que havia alguém no grupo sem visto e que ia avançar para a fronteira mauritana; um africano dizia que teve que ir a Rabat tirar o visto (são só 2.000kms ida e outro tanto de volta); passou de volta um furgão matrícula polaca com dois africanos sem visto – a coisa estava feia...    
A revista aos carros foi exaustiva – mais de meia hora por carro. É em nome da segurança, ok. O pior era a grande probabilidade de ficarmos sem os nossos vinhedos e as nossas cervejolas, tão fresquinhas que iam no magnífico frigo do HDJ. Mais uma grande expectativa.
Chegamos à fronteira mauritana às 11.30h (à marroquina às 08.45)e saímos às 16h. Pachorra. Haja. Ainda bem que as expectativas foram positivas. Passou o Glacius, os vinhedos e as cervejolas. O António lá “convenceu” os fardas a deixar passar o Glacius… O álcool foram precisos grandes coros e a maquina fotográfica desfeita do Fred (tinha caído do jipe para a estrada a cento e vinte à hora a alturas de Al Jadida).
Os custos são de € 12,50 por carro na fronteira e de € 21 para o seguro de 30 dias. Pelo visto já tinhamos pago € 60 cada.
Avancemos para Nouakchott (ou Nãoháquemtenxote como começa a ficar conhecida). No nosso carro quem ganhou a aposta foi o Fred. Vai jantar à pala na capital mauritana. Entramos no deserto mauritano primeiro para leste e depois para sul. O calor começa a apertar forte. Estão 40° e são 16.30h. Uma hora depois, mais interior, o termómetro marca 47°. Paramos a cerca de 130 kms da capital no ponto onde uma catalã e dois catalães tinham sido raptados à 10 meses. Ali fizemos votos para a sua mais rápida libertação em boa saúde. O ar estava irrespirável, denso. O sol torrava, fritava. Não se via nenhum ser vivo. Pelas 19.30, já perto do mar, a temperatura amainou para os 30°.
No controle policial de estrada cerca de 10 kms de Nkt, reparamos que a azáfama era maior que a habitual. Estavam muitos polícias e grande parte deles montados em motas. Ficamos admiradíssimos: era para escoltar a nossa entrada na capital mauritana. Fomos com escolta policial até ao hotel. A escolta não era nada sincronizada entre os motoqueiros e os apeados no terreno. Estávamos a ver quando é que um se “atirava” para o chão. Na via de acesso tudo ok, mas quando entramos na cidade, imaginem a bagunça. Nouakchott quase parou para a gente passar. Nas rotundas era o caos pois os agentes das motas chegavam em relâmpago e pretendiam que o transito parasse de imediato para nos dar prioridade... ninguém se magoou. Lá chegamos ao Hotel El Amade onde o aparato policial era ainda maior. Para além da polícia que nos acompanhava estavam lá pelo menos duas dezenas de policias, comum e militarizada, incluído a célebre “pick up” africana com um guarda e sua arma automática de grande calibre na caixa aberta. O António tinha solicitado escolta desde a fronteira. Como parece que a situação está mais calma as autoridades mauritanas entenderam suficiente a escolta para entrar na cidade. Na minha opinião esta é a melhor forma de chamar a atenção de quem pretendemos evitar.
Muitas vezes a opinião que fazemos de um hotel depende de pormenores sentidos de forma individual que, por esta ou aquela razão, não são iguais para todos os hóspedes. Neste caso uns reclamavam que não tinham AC., outros que o AC. estava óptimo e quase os gelava e ainda outros (o nosso caso) que o AC era deficitário ou nulo. Fica a referência: “Hotel El Amabe”, depois de o habitual regateio e tese de grupo, € 50,00 quarto duplo a.p.a. Capitais é sempre caro. Em Nkt recomendo um "hostal" magnífico e em bom preço perto do Hotel Halima.
Fomos jantar a uma pizzaria conhecida do António longe quanto baste do hotel mas tudo bem: é necessário esticar as pernas e a noite estava amena.
O casal do 4Runner não gostou do hotel e decidiu ir para outro. Não facilitaram: um polícia à porta do hotel e outro à porta do quarto. O Tomas estava estupefacto. Nunca se tinha sentido tão seguro e e tão importantes, disse.



07.08.2010 – O pequeno-almoço foi bom. Aliás tenho reparado que os pequenos-almoços em África estão a melhorar substancialmente.
Na saída de Nkt fomos igualmente escoltados só que com menos aparato e inconveniência para os locais. Sábado, pouco trânsito...
Toca a rumar ao Senegal e a mais uma grande expectativa. Será que vamos conseguir entrar no pais que, desde Junho, decidiu passar a cumprir à risca a lei “morta” sobre a entrada de veículos no pais – é obrigatório levar o CPD – Carnet de Passage en Douane - que em Portugal é emitido pelo ACP mas com exigências inaceitáveis. Nenhum de nós o têm. A ver vamos. Para já, rodas na estrada que a paisagem vai mudar. Se não nos deixarem entrar no Senegal o transtorno é mais que enorme. Implica muito sacrifício já que, além do mais, como vamos pela pista de terra de Diama (ou do PN de Diawling), se não entrarmos e tivermos que voltar são, de uma assentada, 200 kms de pista sem qualquer utilidade; aceder à Rota da Esperança desde Rosso além de ser feito em estradas secundárias são muitas centenas de kms debaixo de temperaturas próximas dos 50° nesta época.
Começa a savana a mostrar as primeiras acácias. Surge a África negra. As casas e as pessoas começam a “oprimir” as estradas. As pessoas não ficam ao longe. Começa o risco da malária – replente obrigatório, roupa que cubra o corpo é bastante aconselhável. Profilaxia como manda o médico.
A pista de Diama encantou toda a gente não só pela sua beleza mas porque o pessoal gosta mesmo é de off-road - taxa de passagem são € 5 por pessoa.



Ao HDJ caiu-lhe uma pala. Embrulha e guarda. Chegamos à fronteira mauritana de Keur Massene – policia mauritana € 10 por carro; passagem da ponte € 20, é sempre a somar, digo, a subtrair, à nossa caixa comum.
Passamos para bandas do Senegal.
Agora é que vão ser elas: convencer os "fardas" para que permitam a entrada dos carros no Senegal sem CPD e carros com mais de cinco anos. Policia senegalesa - € 10 e recebe-se de troco CFA 2.000. Recebe-se se os pedir, senão ficam. Vamos penar para a alfandega. Entra o António que tinha dito que não pagava um euro para além do devido para entrar. Claro que o resto do pessoal estava bastante mais flexível. Todos tínhamos consciência que nos faltava o documento que permitiria a entrada dos carros e que todos eles tinha mais que cinco anos. Passado cerca de uma hora sai sem sucesso. Propus-me tentar. Chegamos á fronteira às 14.30h e eram 18.30h quando estávamos a entrar no Senegal doidos por uma cerveja “Gazelle” gelada na esplanada do Hotel de La Post.



Ainda não tínhamos andado 3 kms, controle de polícia. “Deslargem-me melgas”. Vinham com o  chip do extintor e do triangulo. Và lá, estavam “on board”. Obras na Ponte Faidherbe...



Transito já de si caótico está bloqueado. A entrada de St. Louis é um mercado africano. Topam? Ficamos no La Post: já é paixonite. Regateio, duplo a.p.a € 50 e triplo € 60. Vamos é para a piscina que está óptimo. Depois de uma tarde tão stressante um banho de piscina sobranceira sobre um dos braços do Rio Senegal…



Ligeiro passeio pela cidade. Está “morta”. A crise global espalha-se simultaneamente. Jantar no Flamingo, vista de olhos no bar sempre com “live music” e para o quarto que há wi-fi e colocar as comunicações em ordem. Sono, sono… o romantismo do La Post relaxa, inspira, exalta a saber mais sobre o seu passado e o da cidade colonial onde foi construido. St. Louis foi a primeira capital do Senegal. O nosso quarto fica virado para a rua principal. Durante a noite foram passando autênticas “promenades” de locais tocando e cantando.



08.08.2010 - Domingo. St. Louis acorda devagar e tarde. É o melhor dia para visitar a cidade. Os insectos são menos insistentes que os vendedores e os pedinchas. O pequeno-almoço do La Post melhorou substancialmente. Um ligeiro passeio pela cidade até ao outro braço do Rio Senegal – é a zona piscatória e parece um caixote onde vazaram todo o lixo da ilha. Já nem falo do cheiro. St. Louis está muito mal cuidada e os seus então belos edifícios coloniais estão devolutos e ameaçam ruina.
É hora de seguir viagem. Hoje ficaremos pelas redondezas de Kidira, cidade senegalesa que faz fronteira com o Mali (Diboli). Vamos percorrer a riviera do Senegal que bordeja o rio com o mesmo nome. Os habituais controlos de polícia. As povoações e mercados que esmagam o alcatrão que os separou. “Alhamdoulilahi” deve ser a mais famosa companhia de transporte de passageiros e mercadorias por estas bandas com os seus furgões a cair de podres e de peças. Vá lá, não vi deixarem cair nenhum passageiro ou "encomenda".
Depois de St. Louis só há combustível em Ross Béthio. Vive-se a época das chuvas. Ainda assim, entre as 11.30 e as 17.30h, quando o céu está limpo, tudo arde e quando está encoberto, tudo cose. Imagine-se na época quente. É demais viver debaixo de tamanho rigor climatérico. A sombra é o lugar mais almejado por todos os seres que respiram e se movem. A paisagem está verdejante. As acácias estão “gordas” de tanta folha. Não são os espinhos que sobressaem. Almoçamos debaixo de uma delas. Estão 34° mas corre uma frescura na sombra da nossa protectora solar. Estamos divinos. O pintor que pouse o pincel. Ninguém mexa no climatizador. O Miguel confeccionou e comemos uma "pasta al pene com cogumelos" Continente made que recomendo vivamente. Não se pode comer muito nestas temperaturas.



Circula-se bem. O tapete é bom e o trânsito escasso. Contudo, o condutor não deve baixar a guarda: buracos e animais podem revelar-se fatais. É um esticão de St. Louis a Kidira. A estrada rende ou o cansaço começa a criar depósito.
Perto do destino mais um “ex libris” que ainda não tinha aparecido – o embondeiro (baobab) – a árvore de África, lindas e vestidas de "gala" nesta época húmida.



É precisamente debaixo e ao redor de um enorme exemplar desta espécie que montamos o acampamento para esta noite. Estamos a 10 kms da fronteira, a temperatura está magnífica, fazemos uma fogueira enorme (não há risco de incêndio, está tudo verdejante). Foi uma soirée e noite de rara paz e beleza num palco onde os "músicos" só se ouviam. A meio da noite alguém decidiu refrescar o "quadro", ao de leve, com uma chuva suave. A música, essa, com altos e baixos, nunca parou.



09.08.2010 - O objectivo hoje é Bamako. Para mim é duplo pois fiquei pelo caminho quando pretendia alcançar essa capital em Janeiro com o BB 2010.
Esqueci de referir que com o Ramadão estes países que visitamos acertaram a hora para -1 GMT.
Levantar camping e rumar à fronteira. Logo que se chega a Kidira há que virar à esquerda para o primeiro carimbo de polícia (para quem entra, a aduana é também logo à frente para conseguir o famigerado "passavant"). Voltar e atravessar a vila na direcção da fronteira. Começa o mar de camiões que transportam tudo o que o Mali necessita desde o porto de Dakar no Senegal. O Mali não tem frente para o mar... O Mali pais cujo nome permaneceu do Império do Mali (estado da África Ocidental que existiu entre 1230 e 1600 aproximadamente e abrangia o que hoje, grosso o modo, corresponde ao território ocupado pela Gâmbia, Senegal, Guiné-Bissau, Guiné-Conakri, Mali e Burkina Faso) ficou sem saída para o mar. As mercadorias que chegam ao porto de Dakar com destino ao Mali tem que atravessar todo o Senegal para entrarem no pais tendo que passar mais uma fronteira terrestre o que, em África, é sinónimo de muito tempo perdido, burocracia e "luvas". 
Segundo controle de polícia de fronteira. Segue a alfândega (douane) para dar saída do carro entregando o nosso "precioso" passavant de 48 horas conseguido em Diama.
Finalmente preparo-me para entrar no Mali depois da tentativa falhada de Janeiro com o BB 2010. A fila de camiões dos dois lados da estrada é interminável. Dirigimo-nos á alfândega – papéis do costume, documento único, passaporte e seguro. Tudo bem mas o "fardas" do carimbo não está. Trabalhou até tarde e está a dormir. Há que aguardar. Quanto tempo? Há que aguardar. Afinal, como não temos visto há que ir para trás cerca de um quilómetro e meio fazendo slide através dos camiões, com saídas e entradas de estrada para depois atravessarmos o povoado onde, depois de muito procurar e circular, lá encontramos o comissariado.
Chegamos à fronteira às 8.30h e só às 10.30h é que conseguimos livrar-nos da alfândega contra o pagamento de € 10 por carro. Às 12.00 ficam os vistos prontos. São € 25 por vistos. Mas como pagamos em euros temos que pagar mais € 20 porque os fardas têm que ir a cerca de 20 kms para fazer o câmbio. É gozo... esta malta tem uma imaginação para “sacar pasta”. Tudo pronto para seguir. Tudo ou quase: agora é um camião que bloqueia a estrada. Outro a tentar passar têm um milímetro de cada lado. O milímetro começou a encolher e como resultado foi arrancando pedaços aos camiões que estavam dos lados, deixando também alguns seus. Aparecem os interessados para ver os estragos. Como já temos espaço para passar, aqui vamos nós. É a fronteira rodoviária de mercadorias. Imagino o caos e o "custo" para desalfandegar e fazer circualr as mercadorias mesmo tratando-se de dois paises da UEMOA.
A estrada está boa até Segala. Depois são só buracos. São buracos no asfalto que se o condutor não tem cuidado fica sem um pneu, uma jante, um eixo, etc. Seguíamos à frente, no HDJ e depois o Patrol. Passamos o pessoal do Peugeot 405. Alguns quilómetros à frente o Fred perdeu o Patrol de vista. Paramos para esperar por eles e aproveitar para comer qualquer coisa. Comer, fomos comendo. O Patrol é que não aparecia. Tentamos pelo rádio, nada. Voltamos para trás. Alguns quilómetros depois conseguimos contacto pelo rádio. Vinham a rebocar o Peugeot. Na curva seguinte logo apareceram. O Peugeot não tinha conseguido evitar um buraco mais profundo e partiu o cárter. O Joan e o David decidiram ir a Kayes no carro de um local tentar arranjar um cárter. A Mónica e o Ivan vinham no Peugeot, rebocados pelo Patrol até ao próximo povoado, Sandaré, onde diziam haver um mecânico. Seguimos juntos. O Patrol / Peugeot à frente, nós no HDJ e o Subaru que entretanto apareceu, na vassoura. Rebocar um carro numa estrada cheia de buracos é obra. O rebocado, de travões, só tinha o de mão a funcionar. Imaginem a perícia.
Para completar a "paisagem" à nossa frente segue um autocarro turístico da companhia “Sangue Voyage”. Boa...
Um pouco adiante, a argola de reboque do Peugeot cedeu e o Patrol quase lhe arrancava a frente toda. Toca a parar para “remendar” a frente do Peugeot e procurar outra peça onde amarrar a cinta. Não foi obra fácil. A frente, do lado direito, avançou meio metro. Cinta de aqui, cinta de ali, lá ficou parecido com estava anteriormente, agora em modelo amassado. Para fixar a cinta de reboque houve que subir o carro com o macaco e o corajoso Diego lá se atirou para debaixo do Peugeot para a amarrar ao charriot. Toca a andar que se faz noite...



A povoação nunca mais chegava, chovia, os buracos aumentavam, mas íamos progredindo. Chegamos a Sandaré.
Saímos da estrada para o interior da população. Se aqui não é o fim do mundo devemos estar muito próximo. Juro ter visto "a ultima meia que o diabo perdeu".
Afinal o mecânico está na borda da estrada de onde saímos. Quando paramos para saber onde ficava a oficina do mecânico, como do costume, juntou-se toda a populaça e desde logo, o tolo da aldeia que, trazia algo parecido com uma viola. A viola tinha um tubo ligado à caixa que o "virtuosi" colocava no ouvido quando tocava. Devia era surdo como uma porta...
Lá apareceu o mecânico. Há que empurrar o carro para a oficina que fica a uns 50 metros. Custou-nos muito deixa-los. Mas foram eles que escolheram tamanha aventura: atravessar meia África num Peugeot 405 é uma escolha arrojada ou pelo menos as probabilidades de avarias e contratempos é muito superior. Isto fazia parte da aventura. Ficamos em contacto.
O Subaru decidiu ficar mais um pouco até que os outros chegassem o que não tardaria muito dada a informação que logo recebemos. São 17.30h e ainda não andamos nada. Tarda nada escurece. Seguimos para Bamako? Ficamos em Diema? Para já o objectivo é Bamako pois passado Sandaré o asfalto está impecável. O trânsito é diminuto. É só andar. Os quilómetros é que ainda são muitos.
Começa a chover forte. Parece que cai em chapa quente. A luz do dia também não vai aguentar muito. Pelas 18h anoitece. Bem sabemos um principio básico – não conduzir em África à noite – mas a vontade de chegar a Bamako é muita, tanto mais que, pelo caminho, só dormindo em camping selvagem e há tantos, mas tantos, insectos no ar que a ideia não nos soa bem. Faltam 300 kms. Decidimos fazer um café. Já tínhamos percebido que não ia ser fácil sair dos carros. O ar estava empestado de insectos. Não só nos picavam como os respirávamos e, se abrissemos a boca... estavam "dissolvidos" no ar que respiravamos. Insistimos. A noite está magnífica (não fora a bicheza voadora). No meio do nada pode-se observar convenientemente o céu em todo o seu esplendor. Os sons da savana também eram emitidos sem receios e sem interferências. Fizemos e tomamos o café para logo seguir viagem. A 100 kms de Bamako, do lado esquerdo da estrada estava parte do grupo acampado. Paramos só para dizer ao António que só parávamos em Bamako e despedimo-nos até ao dia seguinte.
Os últimos quilómetros têm mais metros. Nos arredores de Bamako a estrada começa a subir até aos 550 metros. A cidade estende-se pela planície que se segue. De cima enxergamos o “lago” de luzes da cidade, qual Los Angeles. São 2.30h da madrugada. Ainda assim não resistimos a dar uma volta de carro pela cidade.
Segunda-feira a cidade está calma mas nos arredores das discotecas há uma multidão aguardando entrada. Depois do passeio fora de horas fomos para o Grande Hotel de Bamako que é um pouco carote. Capital é capital. Depois de muito negociar lá fixamos o alojamento em € 80 por quarto. Ficamos bem instalados.

10.08.2010 – Depois de muito negociarmos lá conseguimos um lauto pequeno-almoço “self-service” por € 15 para dois. Em África se não se negoceia paga-se o dobro ou o triplo, mesmo nos melhores hoteis. Eles adoram negociar. Os árabes meterem-lhe o vício no sangue. A transacção não tem graça se não é discutida, negociada, "bebida". O HDJ tem uma cavilha no pneu traseiro esquerdo. É um atraso para as nossas intenções de chegar cedo à embaixada do Burkina Faso para solicitar (e pagar bem pagos) os vistos. Passaporte, formulário preenchido, duas fotos e CFA 47.000. Tinha que ser pago em CFAs. Com a proeminência do euro raramente tenho moeda local. Lá fomos a um hotel próximo sacar CFAs de uma caixa automática. À saída diz a “madame” do guichet: “Passem aqui amanhã de manhã". O quê? Hoje temos que ir dormir a Segou. "Ok, passem às 15h e se não estiver pronto esperam. É que há muitos vistos para emitir”. O pessoal por estas bandas é muito ocupado em deixar correr a vida.
Voltamos para o hotel. Está fresco e lá fora está canícula. Há wi-fi, cervejinha e uns belos sofás. Pagamos caro a estadia e o pequeno almoço. Agora usufriumos de umas horas de sofá, internet e ar condionado e cervejinha bem fresca. Relaxemos.
A máquina MB do hotel “apanhou” o cartão ao Tomás. Pronto já tem que penar. Consegue o número de telefone da encarregada da máquina e já não a larga mais com chamadas. Por volta das 14.30 lá conseguiu reaver o cartão. As 15h saímos para a embaixada e às 15.30 já tínhamos os passaportes com os vistos e estávamos aptos para abalar para Segou. Para deixar Bamako atravessamos o Rio Níger que, juntamente com o seu afluente Bani, nos vai acompanhar nos próximos dias. Estão a transbordar nesta época. Embora o Mali não tenha SCUTS, tem portagens. Seguimos para Segou. A savana apresenta agora evidências de transição para a "rainforest", sua vizinha mais a sul. Segou fica na margem sul do Rio Níger. Chegamos já de noite. A entrada em Segou é feita numa estrada recta com uns 12 kms totalmente iluminada como poucas na Europa. Ficamos admirados. O “Auberge” era castiço, típico, com boa musica e bom ambiente.



Apareceram os habituais vendedores de porta de hotel, um dos quais um tuareg vestido a rigor. Lá lhe comprei um cachimbo e dois colares depois das habituais negociações. Sempre que negoceio com muçulmanos fico com a sensação que fiz um mau negócio. Desta não foi excepção. Este pessoal também precisa de encaixar umas moedas. Este, além do mais, dizia-se vindo de Tombuctu e estava vestido e bronzeado a rigor.



Os quartos são separados uns metros da recepção e do restaurante onde jantamos bastante bem.

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